terça-feira, 15 de dezembro de 2009

Travessias

as cidades parecem se estender para além dos limites do seu território.
paisagem alargada
como casas abrigam a dispersão, a fúria, a desmedida dos corpos.
acolhem a embriaguez dos homens, o êxtase dos amantes, o medo dos poetas.
hospedam amores inventados, os encontros alegres; o torto, o belo, o feio,
o reto. o incontido.
têm cheiro, voz, olhar.
traços invisíveis a pairar como névoa sob os olhares atentos apenas àquilo
que se pode apreender do visível.
cidades para sentir, tocar com a delicadeza da leitura desatenta, escorregadia.
um sopro que faz o invisível escorrer feito àgua que se desfaz por entre os dedos,
lábios e olhos aflitos.
escorre
esco
es
sss
s
o som, leve ruído,
cidade invisível e seus afetos.

Uma cidade é para se viver não para se atravessar.

Exercício de observação do dia


Para fazer um exercício de obeservação do dia: formas breves porque li que é melhor não se alongar nas explicações dos fatos. Tem sol, mas não em todos os momentos. Vez por outra ele se esconde deixando que a leveza da brisa engane os sentidos. Na dúvida quanto a sair ou não a esquiva parece ser a escolha. Talvez tenha medo do ar que irrompe do dia ou, ao menos, da estranheza da tarde. Faz calor, mas não a ponto de deixar a brisa parada. Há movimento. Sinto um calafrio subindo pelas costas enquanto aguardo a notícia. Tenho medo. Invade-me outra vez a aflição e a estreiteza da vida. A sua precariedade. A voz irrompe no fluxo de palavras descontínuas. Em que lugar ela se assenta para produzir seus traços? Com ela invento ficções que tocam o chão da realidade. Quero lembrar, não. Deixo passar para que o sol não se espante com os ares de saturno.